segunda-feira, fevereiro 02, 2009


Comentários do jornalista Marcus Gusmão sobre o caso cultura...

 

Caro Joli,
Toda vez que este assunto aparece na minha frente na tela do computador eu me coço para não opinar. Sou jornalista técnico do Estado e atualmente trabalho na assessoria de comunicação da Secult. Portanto, qualquer defesa que eu faça de Márcio vai soar, justamente, como puxa-saquismo. A meu favor só tenho o fato de eu ser funcionário concursado e estabilizado, portanto sem cargo e motivos pecuniários para puxar o saco de quem quer que seja.
A Secult e uma das secretarias por onde passa menos dinheiro e mais fofoca na imprensa. É da natureza da cultura esse disse-me-disse. Talvez numa única obra silenciosa do Estado, como o emissário submarino, circule mais dinheiro do que todo o orçamento em projetos culturais de uma dezena de anos na Cultura, mas a gente tem o hábito de respeitar argumentos de doutor engenheiro e duvidar da arte. Talvez, num longo prazo, isto seja mais benéfico à arte.
Não é de hoje que atiram contra Márcio. Mu itos não merecem crédito, como Samuel Celestino, que tem uma empresa de assessoria de imprensa, portanto afeito a opinião devidamente remunerada. Tampouco Mário Kértesz, de quem admiro a inteligência, o humor e a esculhambação, e que parece esculhambar mais por vaidade e por lealdade aos amigos, como Roberto Pinho e Risério. Mas é visível também a sua mudança de opinião em função departamento comercial da rádio, embora ele negue sempre isso, em tom irritado. Mas você tem o meu crédito. Confio na sua opinião e por isso estou aqui a argumentar.
Talvez a Secult tenha sido a secretaria onde houve mais mudança neste novo governo. Talvez seja a secretaria onde a lógica de ACM tenha sido mais contrariada. E falo lógica de ACM não como crítica e sim como constatação. ACM tinha um profundo conhecimento da cultura baiana. Nesta opinião sou acompanhado por João Ubaldo e Glauber Rocha. E dele vinha o sim ou o não de tudo, absolutamente tudo. E este é um método que não cabe mais. Óbvio.
Recentemente me surpreendi, com a informação de que Jaime Figura, aquele louco perfomático que vive nas ruas numa espécie de burca, era fã de ACM e recebeu uma casa no pelourinho, via Conder. É um exemplo pontual da noção que ACM tinha da importância de figuras como esta para a cultura.
Márcio resolveu abrir o leque, fomentar a cultura via editais. Desmontou o esquema anterior, que tinha lá sua eficiência, mas concentrava recursos. Mas o dinheiro para a cultura é curto. Aí está também a origem da grita.
Tem a dificuldade adicional do monstro da burocracia, e quem já entrou com um processo no Estado sabe do que estou falando. Mas a trancos e barrancos as coisas estão andando e eu sou otimista quanto aos efeitos a médio e longo prazos destas mudanças.
A artilharia contra Márcio é pesada, e parte sim de quem teve interesse contrariado. O fogo e a fumaça desta guerra escondem projetos que de fato m ereciam ser debatidos. Fico apenas em um deles, os Pontos de Cultura, algo absolutamente inédito, gestado por Gil quando ministro, que por sinal enfrentou resistência semelhante no ministério.
Na época Gil quase entra no esparro de aprovar a construção de vários centros de cultura no país, elefantes brancos de um tal portfólio imobiliário das Bases de Apoio à Cultura, que iriam gerar muito lucro pra construtoras e despesa para a burocracia do estado para serem mantidos. Lembra da exoneração de Roberto Pinho? Relembre aqui. http://www.cultura.gov.br/site/2004/02/18/nota-de-esclarecimento-6/ Foi quando surgiu o projeto Pontos de Cultura, idealizado por Célio Turino, para quem cultura é fluxo e não estrutura.
O ovo de Colombo dos pontos de Cultura é justamente não criar nada. Apenas apoiar o que já existe - edital de R$ 180 mil em três anos para organiz ação cultural - e o que existe é grandioso neste pais afora. Fui no final do ano passado a Brasilia, de buzu, com mais de uma centena de artistas e representantes dos novos pontos de cultura da Bahia , à reunião da Teia http://www.iteia.org.br/teia-2008-iguais-na-diferenca/2 no final do ano passado, encontro que reuniu mais de 600 dos cerca de 800 pontos de cultura do país. Era impressionante a diversidade, a vitalidade e a força destes grupos.
Testemunhei o encontro de uma aprendiz de griô de uma cidadezinha da foz do São Francisco com Zé do Pife. Os dois ali, aprendiz e mestre, por horas trocando arte. Ali estava a síntese do projeto. Veja. http://licuri.wordpress.com/2008/11/16/sintese/

Agora em março, os 150 novos pontos de Cultura da Bahia vão se reunir com os cerca de 60 já existentes. Taí uma oportunidade para você e outros jornalistas conhecerem de perto esta nova realidade da cultura na Bahia. Voltarei ao assunto.
Amplexos.

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