terça-feira, março 18, 2008


Axenofobia e as junônias


JOLIVALDO FREITAS

 Participando, recentemente, de evento reunindo jornalistas de toda a região Nordeste, onde o tema principal era valorização dos festejos juninos, pude vivenciar uma cena emblemática daquilo que o País pensa acerca da música baiana. Tomei a ousadia de cunhar este neologismo "axenofobia", pois sintetiza o sentimento sobre a axé music.

Uma folclorista sergipana passou a explanar sobre a origem da festa de São João, partindo lá da Grécia antiga (a.C.), seguindo por Roma (d.C.), resvalando na França, Inglaterra e Portugal e chegando aos nordestinos atuais.

Tudo bem, até o momento em que ela, demonstrando todo um sentimento xenófobo, garantiu que: 1) na Bahia não tem festa de São João; 2) a música baiana é culpada de acabar com as manifestações folclóricas.

Contestei as afirmações. Dos 417 municípios baianos, mais de 300 promovem algum tipo de festa durante o São João, seja com triângulo, zabumba e sanfona, megagrupos ou mesmo trios elétricos que tocam até pé-de-serra. O São João mobiliza mais da metade da população; gera 150 mil empregos temporários e renda de quase quatro milhões de reais, no período.

Portanto, enquanto em Pernambuco o São João se concentra em Caruaru, na Paraíba, em Campina Grande e em Sergipe está em Areia Branca, na Bahia, só para citar as maiores produções, temos as tradicionais festas de Cachoeira, Jequié, Senhor do Bonfim, Cruz das Almas, Maragojipe, Amargosa, Paulo Afonso, Juazeiro e centenas de outras.

Já com relação à axé music, que teve origem com o fricote de Luiz Caldas e o deboche de Sarajane e Laurinha, nos anos 80 do século passado, não se pode dizer que é a música dos sonhos. Posso não gostar da axé music.

Mas não devo me furtar, como disse à historiadora, de lembrar que existe algo chamado diversidade, e é muito raro um "movimento" anular uma manifestação folclórica.

O folclore sempre serviu de base para movimentos culturais.

Se marujada, batucajé, coco, nau-catarineta, jongo, punga e outros estão desaparecendo, é por falta de apoio oficial às comunidades onde elas se concentravam e foram enfraquecendo.

Não se pode culpar os "chicleteiros" ou Ivete Sangalo. A axé music em nenhum momento se arvorou a ser manifestação folclórica, nem arte erudita.

Desde os anos 60 que os pesquisadores já se queixavam da ausência das quadrilhas nas festas de São João, assim como os jornais de priscas eras chamavam a atenção para o sumiço de manifestações diversas como o sarambeque.

Daí se dizer que os baianos estão devastando a cultura popular é a mesma coisa que comparar as junônias, no solstício do verão europeu, aos atuais festejos juninos. Para mim, quem diz isso está falando grego.
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Artigo publicado originalmente em A Tarde (17.3.08) - Página Opinião
 

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